TCC e Inteligência Artificial: A Diferença entre Ferramenta e Plágio
As recentes tecnologias de Inteligência Artificial têm gerado um leque inusitado de possibilidades de suporte a pesquisas acadêmicas.
No entanto, o uso desses recursos no Trabalho de Conclusão de Curso, se não for avaliado com critério, pode ser interpretado como plágio e, portanto, uma violação contra a ética acadêmica. Plágio e uso de ferramentas de IAs são fenômenos diferentes, que precisam ser claramente delimitados. Práticas acadêmicas não são boas ou más em si. O que as torna moralmente reprováveis são as intenções e as consequências que delas resultam.
O objetivo deste artigo é esclarecer a diferença entre o uso de IAs como ferramenta de suporte a um TCC e o uso de IAs como potencial gerador de plágio.
Para tanto, faz-se a seguinte pergunta: a utilização de ferramentas de inteligência artificial pode ampliar o suporte metodológico de um TCC sem que se perca a autoria e a responsabilidade intelectual do trabalho? Para responder a essa questão, os conceitos de inteligência artificial, ferramenta acadêmica, plágio, autoria, originalidade e conformidade com as normas institucionais devem ser discutidos.
Também devem ser analisadas as diretrizes de universidades e programas de pós-graduação, os procedimentos de avaliação e os princípios éticos que regulamentam o uso de Inteligência Artificial.
Inteligência artificial (IA) é um ramo da ciência da computação que busca criar máquinas capazes de simular funções cognitivas humanas, como raciocínio, aprendizado, percepção e interação em linguagem natural (BRANCO; AURÉ; MULLER, 2023, p. 220). O termo foi inicialmente proposto por John McCarthy em 1956, introduzindo a ideia de que as computações poderiam ser realizadas da mesma forma que os seres humanos. Nos anos seguintes, ocorreram avanços com a automação do jogo de damas e a criação do primeiro programa de reconhecimento de fala, mas a escassez de resultados práticos e a limitação dos modelos disponíveis levaram a um período de inatividade, conhecido como “inverno da IA”. A reativação do setor ocorreu em 1980, com o uso de regras de conhecimento, e a partir de 2010, com o aumento do poder computacional e a explosão de dados na internet. Nessa fase, os sistemas de IA baseados em aprendizado profundo, em especial as redes neurais, possibilitaram resultados expressivos em tarefas como tradução automática, reconhecimento de imagens e produção de textos em linguagem natural. O ChatGPT, que utiliza um modelo de linguagem, é um exemplo dessa nova geração de ferramentas.
O uso de IA pode ser considerado uma ferramenta acadêmica sempre que contribui para a estruturação, organização, sistematização, análise, redação ou verificação da conformidade de alguma parte do trabalho acadêmico, mas sob a supervisão, responsabilidade e atribuição autoral do pesquisador. O plágio, ao contrário, é a apropriação e a atribuição indevida de ideias ou palavras de outrem, violando a propriedade intelectual e, em última análise, a ética da pesquisa e do aprendizado. A norma culta da língua escrita não é de domínio exclusivo do autor e, portanto, não pode caracterizar uma “análise comparativa” quando a redação é realizada por alguém que não domina um dos idiomas ou por um sistema automatizado. Embora o plágio de uma forma ou de outra já tenha sido objeto das normas de diversas instituições, as exigências da Lei de Direitos Autorais (BRASIL, 1998) e da Lei de Proteção à Propriedade Intelectual (BRASIL, 1992) devem ser seguidas em todos os níveis educacionais.
Inteligência Artificial como ferramenta de apoio ao TCC
A utilização de inteligência artificial em tarefas escolares apresenta particularidades que a diferenciam do seu emprego em trabalhos acadêmicos de maior complexidade. No caso do TCC, a estipulação clara da autoria oferece a possibilidade de um uso que respeita as implicações éticas, culturais e legais do plágio. Nesse sentido, a IA pode ser encarada como mais um recurso que amplia a possibilidade de suporte metodológico, desde que não seja utilizada de modo a impedir a reflexão, pesquisa e produção criativa e crítica do aluno.
A utilização de IA pode ser útil em diversos momentos do desenvolvimento do trabalho. Na fase de geração de ideias e estruturação da pesquisa, a IA revela-se um recurso interessante para mapear hipóteses a serem testadas e organizar o plano de estudo, incluindo a definição da ordem dos capítulos. Na redação, ela pode ser utilizada para receber sugestões de estilo e de melhoria da coerência, além de receber conselhos sobre a adequação do texto à finalidade didática. Nesse contexto, o uso de IA que traz benefícios ao aluno consiste principalmente na melhoria da clareza da redação, sem assumir a autoria do texto. Em fases mais avançadas da pesquisa, a IA pode ser empregada com o objetivo de validar as fontes utilizadas, sendo útil para verificar a presença de informações nos endereços citados, identificar a confiabilidade de uma fonte ou mesmo assinalar indícios de inconsistência nas afirmações apresentadas.
Riscos e limites da utilização de IA em trabalhos acadêmicos
As ferramentas de inteligência artificial podem ampliar o suporte metodológico proporcionado por professores e outras fontes, mas a responsabilidade pela escolha das ideias, pela elaboração e redação dos textos deve ser exclusivamente do estudante, sob pena de desvirtuamento do objetivo do TCC. A originalidade do trabalho, por sua vez, requer a atribuição adequada de partes geradas não apenas por sistemáticas externas e automatizadas de produção de linguagem, mas também por qualquer fonte não devidamente indicada.
As questões de originalidade e de autoria são, portanto, especialmente críticas na utilização de ferramentas com potencial plagiário. O emprego destas deve ser feito por meio de uma escolha consciente e sob um controle responsável, que delimite e determine claramente aquelas partes do trabalho que são gradualmente geradas ou aprimoradas por sistemas de IA, evitando-se assim uma apropriação indevida do produto da atuação de outras inteligências, seja das máquinas, seja de seres humanos. A transparência, nesse sentido, é um valor essencial. O relato do emprego de ferramentas de IA, com a data em que foram consultadas, a versão utilizada e trechos que foram submetidos ao seu processamento, é um dos mecanismos que minimiza os riscos de plágio e confere um caráter esclarecedor a uma eventual utilização que reproduza o conteúdo de forma não atribuída. A confiabilidade das informações geradas é o outro grande risco a ser avaliado. Além de qualquer verificação e validação que cada fonte tenha que ter, as informações geradas pela IA devem ser cruzadas com as fontes originais.
Boas práticas para evitar plágio ao empregar IA
O uso de sistemas de Inteligência Artificial pode gerar plágio de modo involuntário, tornar-se uma prática antiética ou constituir mesmo fraude acadêmica, dependendo da forma como são utilizadas. Para contornar essas armadilhas, algumas recomendações podem ser seguidas. Primeiro, o objetivo a ser atingido com a IA deve ser bem definido, assim como as partes do trabalho que podem ser realizadas através dela, sem que o resultado se afaste do estilo utilizando no restante da redação. Segundo, a resposta da IA não deve ser copiada na íntegra. Ao utilizar trechos gerados por IA, deve-se padronizar a estrutura das citações. Para citações diretas, a norma ABNT NBR 10520 deve ser aplicada, respeitando-se a formatação que se pretende dar ao trabalho. Para citações indiretas, o sistema deve ser considerado uma fonte secundária, devendo ser referenciada como tal, uma vez que permitiu o acesso indireto ao material. Por último, o material gerado por IA – assim como qualquer outra parte do trabalho – deve passar por um processo de revisão e verificação de conteúdo, com checagem independente, comparação com fontes originais e documentação de todas as alterações.
Conclusão
Embora um estudante de graduação tenha normalmente menos autonomia e segurança na utilização de IAs em seu trabalho em relação a um doutorando, o uso da tecnologia pode ainda assim representar uma grande ajuda. Uma boa prática para garantir a idoneidade acadêmica do uso de IA em um TCC de graduação reside na definição da estrutura básica do trabalho em etapas anteriores. Ao definir o tema, a hipótese e os objetivos principais, e ao elaborar o plano de estudo, inclusive com uma narrativa que esboce cada capítulo sem se ater a detalhes, o estudante revela a sua própria autoria. A IA pode ser utilizada a partir dessas etapas como uma ferramenta que apresenta sugestões, assim como os livros, sites, professores e colegas são consultados durante a pesquisa.




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